A Vitrolinha
Não Foi Por Acaso
Quando eu tinha por volta de quinze anos estava estudando eletrônica e meu pai havia me dado de presente uma vitrola portátil. Para quem não conhece, é um aparelho destinado a tocar aqueles discos antigos de vinil, chamados LPs. Eu gostava muito de ouvir música e usava aquela vitrolinha diariamente; até que o cristal da agulha foi se desgastando e ela parou de tocar; ficou “muda”.
Vou tentar explicar nas palavras mais simples que posso como esse tipo de cristal funciona. Por que esse nome: “cristal”? Quase ninguém sabe, mas o nome vem do material existente dentro daquela peça, daquele componente eletrônico onde ficava a agulha que tocava os discos. Dentro daquela pecinha plástica existia uma pedrinha, como se fosse um cristal feito de um material chamado sal de Rochelle. Ele é que transformava a vibração da agulha em uma espécie de “eletricidade sonora”, cujo volume era amplificado pelo aparelho e reproduzido pelo auto-falante.
Acontece que essa pedrinha de sal de Rochelle é sensível à umidade, mesmo do ar atmosférico, e com o tempo vai se deteriorando e, consequentemente, perdendo a capacidade de captar os sons do disco. E foi isso o que aconteceu com a minha vitrolinha, de forma que eu não estava mais podendo usá-la.
Eu não tinha dúvidas de que o cristal estava perdido porque eu já tinha conhecimentos suficientes da área da eletrônica para isso, tanto por causa do curso que estava fazendo, como pelo fato de já ter notado uma mancha verde no cristal, característica de quando o mesmo já foi danificado pela umidade. Eu não havia tido ainda a chance de comprar outro cristal e estava sentindo falta de ouvir meus discos preferidos, sendo que eu sempre apreciei músicas de quartetos e de corais.
Num daqueles dias, no final de uma tarde, eu encontrei um amigo que também gostava de música e tinha nas mãos um LP (disco) do Coral Carlos Gomes, que eu apreciava muito, mas cuja gravação que estava nas mãos dele eu desconhecia até mesmo a existência. Era um LP muito precioso que, mesmo naquela época, já era antigo, uma raridade. Vendo que eu manifestava apreciação, José Domingos perguntou-me se eu queria levar o disco para casa por aquela noite para copiá-lo em uma fica K7 e devolver-lhe no dia seguinte, quando nos encontraríamos novamente. Eu aceitei com alegria, mesmo não sabendo como iria aproveitar aquela oportunidade, uma vez que a minha vitrolinha estava com defeito.
Indo para casa com aquele tesouro nas mãos, orei a DEUS pedindo que Ele me ajudasse a conseguir um meio de aproveitar aquela oportunidade, pois peguei o disco no início de uma noite de sábado e no domingo não haveria onde comprar um cristal novo, mesmo que eu tivesse o dinheiro para isso; o que não era o caso naquele momento.
Chegando em casa, resolvi ligar a minha vitrolinha só para tentar ouvir baixinho o barulho da agulha no disco, mesmo sem o som sair do alto-falante, enquanto ficava imaginando qual seria a forma daquele problema ser resolvido. Quem entende de eletrônica sabe que um cristal de sal de Rochelle, quando estraga, não tem volta; está definitivamente perdido - e o meu já tinha ficado completamente mudo. Será que eu teria algum amigo que teria uma vitrola na qual eu pudesse tocar o disco e gravar em tempo de devolver no prazo combinado? Eu não me lembrava de ninguém. Eu não sabia qual seria a resposta divina.
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Texto extraído do livro
Não Foi Por Acaso
da Editora Luzes da Alvorada.
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